Por Fernando Brito, no blog Tijolaço:
A reportagem de Raphael Gomide e Lívia Salles, na Época, – se a apuração dos dados está correta, o que é provável, porque compatível com os dados parciais que, aqui e ali, começam a ser divulgados – mostrando que a média salarial dos juízes e promotores estaduais – vejam bem, média! – supera os R$ 40 mil mensais não é escandalosa simplesmente porque somos um país pobre, onde faltam recursos para dar ao serviço público a qualidade devida como, sobretudo, porque corrompeu moralmente o senso de equilíbrio do poder contra o qual cidadão algum pode insurgir-se, senão dentro daquela que deixou de ser uma magistratura para, antes disso, ser uma corporação de privilégios.
É de cair o queixo das “explicações” dos representantes das categorias.
O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), João Ricardo dos Santos Costa, diz claramente que foram dados “jeitinhos”, com as benesses autoconcedidas, para serem remunerados “aparentemente acima do teto” e tem a cara-dura de dizer que estas “são vias legais que a carreira buscou de complementar os reajustes para recompor o salário, de acordo com a norma constitucional.”. Na mesma indecorosa linha vai a presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), Norma Cavalcanti, ao dizer que “os penduricalhos são a busca da correção” e que, concedidos por lei, são pagos “enquanto o STF não disser que é ilegal” e que nem assim serão devolvido.
É o tal ex-nunc, o produzir efeitos só quando é decidido e não valendo para antes. Ou, em malandrês: colou até agora, foi bom enquanto durou.
Isso, é claro, quando o STF ou o CNJ decidem na linha da moralidade e da austeridade.
Há um nítido caso de corrupção mental embutido nestes juízos – juízos, com “o”, antes que “suas excelências” ainda queiram tomar algum deste modesto blog – de valor (ou de valores) e certamente não é o caso de todos, porque alguns poucos camelos são capazes de cruzar o buraco de uma agulha.
Esta situação, para mim, levanta duas questões talvez mais graves que a montanha de dinheiro que se vai – e boa parte sequer com impostos, porque são verbas “indenizatórias” – com o salário de “suas excelências”.
A primeira é o fundado sentimento de que quem faz isso, sem decoro ou remorsos, contra os cofres públicos tenha a capacidade de defendê-los e defender, assim, o interesse coletivo. O Estado – não é difícil que se desenvolva assim o pensamento de quem encontra justificativas “morais” e legais para obter o que acham ser o direito divino que obtiveram ao ser aprovados num concurso – é para ser saqueado.
Nas leis e nos processos que procuram preservar o interesse social, no Judiciário, frequentemente o Estado sai perdendo, com a ajuda de procuradorias que o defendem com leniência, ressalvados os honrosos casos em que seus integrantes não agem apenas burocraticamente como advogados públicos.
A segunda é a cultura da “nobreza” que vai absorvendo a mente dos senhores magistrados e promotores. Já os vi, alguns, em périplos familiares com um séquito de mucamas a cuidar-lhes as crianças. Passavam empertigados, pavões, ao ponto de parecerem-se ao inevitável trocadilho com a Corte.
O mundo lhes é servil e isso é combustível para o comportamento prevalecido que, a toda hora, acaba nas páginas dos jornais, aliás, em geral sem consequências.
Estes homens e mulheres “especiais” julgam-nos, aos cidadãos comuns.
E nossas realidades lhes vão ficando distantes como a falta de pão não era imaginável a Maria Antonieta.
Com direito a brioches tornados ternos em Miami.
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